Cabelos
Parece que do “é proibido envelhecer” passámos ao “é proibido não querer envelhecer da maneira que a nova ordem do natural exige”.
Se me perguntarem quais são as melhores invenções do século XX eu reponderei que a tinta para os cabelos está na lista.
Não me gosto de ver com cabelos brancos, adoro o meu castanho original, e por isso vou ao cabeleireiro a cada oito semanas cobrir as raízes com uma tinta orgânica e vegan, que foi uma benção descobrir, pois as restantes fazem-me alergia. Não o faço porque me sinto obrigada pelos parâmetros da sociedade ou coagida por uma força coletiva que dita que é proibido às mulheres envelhecerem, faço-o porque gosto, porque é assim que prefiro, porque quero, porque posso, porque me apetece.
Por todas as mulheres que decidiram não pintar os seus cabelos e usufruir em pleno das matizes cinzentas que a idade lhes traz (e não é preciso ser muita idade, há mulheres que aos 18 anos já têm cabelos brancos), eu só posso sentir felicidade. Que bom que é podermos fazer aquilo que queremos e nos dá prazer com o nosso corpo e com a nossa beleza.
A todas as mulheres e homens (claro que muitos homens têm sempre uma palavra a dizer sobre o corpo da mulher) que criticam quem pinta os cabelos porque “não aceita a idade”, eu só posso dizer que é pena. Sinto mesmo muita pena que, ao invés de caminharmos para a liberdade, algumas pessoas estejam a virar os preconceitos ao contrário. Parece que do “é proibido envelhecer” passámos ao “é proibido não querer envelhecer da maneira que a nova ordem do natural exige”.
Zero paciência para capas de revista com mulheres que optaram por ter o cabelo branco com títulos a elogiar o feito criticando de forma rasteira quem opta por fazer o contrário. É possível elogiar sem superioridade moral, sabiam?
Tão feio é criticar quem não pinta o cabelo como quem o pinta.
Porque é que nós mulheres ainda permitimos que continuem a tecer comentários às nossas escolhas de beleza? Porque é que nos deixamos enredar nesta malha de intrigas? E muitas vamos atrás, do alto do nosso feminismo em pés de barro, dos gurus do socialmente correto e mandamos abaixo quem pinta e quem não pinta, quem faz tratamentos estéticos e quem não faz, quem tem barriga depois do parto e quem se esfalfa no ginásio para não a ter.
Alimentamos o tal cão que, esteja onde e como estiver, prende-nos sempre.