A discussão
Ali estivemos alguns minutos, ao telefone, a esgrimir argumentos, mas com serenidade e cuidado para não ferir com palavras os sentimentos que nutrimos uma pela outra.
As discussões são difíceis. Só de escrever sobre uma discussão já é difícil.
Hoje tive a minha primeira discussão de que me lembro em muito tempo em que não fiquei de rastos a seguir. É possível. Foi com uma grande amiga, daquelas que levamos para a eternidade. Embora não seja de todo negacionista – correu à primeira chamada a vacinar-se e cumpre todas regras por si e pelos outros -, tem receio de vacinar a sua criança e escolheu, pelo menos para já, não o fazer argumentando a falta de tempo para consolidar dados mais fidedignos dos efeitos da toma da mesma nas crianças.
O meu nível de intolerância tem subido com a pandemia, admito. E digo-o com muita pena e vergonha. Tornei-me pior nessa questão de aceitar a diferença de opiniões, no que à saúde – covid, vacinas, distanciamento social, higiene respiratória – diz respeito. E fiquei triste com a escolha dela; não compreendo que se tenha receio dos efeitos da vacina e não se tenha ainda mais receio dos efeitos da doença.
Ali estivemos alguns minutos, ao telefone, a esgrimir argumentos, mas com serenidade e cuidado para não ferir com palavras os sentimentos que nutrimos uma pela outra. É das pessoas em quem mais confio na vida e por isso acabámos a discussão com amor. Sem dor. Talvez porque ambas confessámos não termos certezas de nada (quem tem?), com cada uma escolhendo uma resposta diferente para essa incerteza. Eu preocupada, ela por certo triste por não nos entendermos nisto.
E eu, acima de tudo, com uma vontade imensa de abraçá-la.